STF inicia julgamento sobre sacrifício de animais em rituais
religiosos
por:
Eliane Rubim
No dia 9
de agosto de 2018, será julgado pelo Supremo tribunal Federal –
STF o Recurso Extraordinário - RE
494.601, interposto pelo Ministério Público
(MP) do estado do Rio Grande do Sul, contra o Tribunal de Justiça
(TJ) gaúcho. O RE 494.601 questiona a constitucionalidade da Lei
Estadual nº 12.131/04, em vigência no Rio Grande do Sul, que
modificou o código estadual de proteção dos animais em 2004,
excepcionando os cultos das religiões de “matrizes africanas” da
proibição de crueldade.
Os
desembargadores gaúchos consideraram que a lei não fere a
Constituição estadual, desde que os animais sejam mortos “sem
excessos ou crueldade”. O tribunal concluiu também que “não há
norma que proíba a morte de animais, e, de toda sorte, no caso a
liberdade de culto permitiria a prática”.
O MP alega que a exceção dada as religiões de matrizes africanas,
baseada na previsão da liberdade
religiosa na Constituição Federal,
não lhes dá o direito de cometer um crime contra os animais.
E que a lei 12.131/04, segundo o RE, “invade a competência da
União para legislar sobre matéria penal, assim como haveria
privilégio concedido aos cultos das religiões de matriz africana
para o sacrifício ritual de animais, ofendendo a isonomia e
contrapondo-se ao caráter laico do país”.
Sobre a tensão de direitos entre proteção animal e liberdade religiosa, o sacrifício ritual de animais nas religiões de matriz africana não pode ser criminalizado nem perante a lei de crimes ambientais nem perante a lei de contravenções penais, pois ao realizá-lo o/a sacerdote/iza não tem a intensão de submeter os animais a maus tratos ou matá-los. O abate tradicional ou sacrifício de animais, que alguns integrantes dos povos tradicionais de matriz africana chamam de sacralização, é uma prática fundamental da liturgia desses povos.
Sobre a tensão de direitos entre proteção animal e liberdade religiosa, o sacrifício ritual de animais nas religiões de matriz africana não pode ser criminalizado nem perante a lei de crimes ambientais nem perante a lei de contravenções penais, pois ao realizá-lo o/a sacerdote/iza não tem a intensão de submeter os animais a maus tratos ou matá-los. O abate tradicional ou sacrifício de animais, que alguns integrantes dos povos tradicionais de matriz africana chamam de sacralização, é uma prática fundamental da liturgia desses povos.
Representantes de religiões de matriz afro criticam a proibição e alegam que se trata de preconceito e racismo contra um segmento. O abate para fins de culto não fere a Declaração Universal dos Direitos dos Animais. Além disso, essas lideranças alegam que outras religiões praticam o procedimento, porém não são alvo de perseguições legais.
No ano passado, representantes da Comissão dos Terreiros Tombados da Bahia e outras lideranças religiosas e da sociedade civil se reuniram com a presidente do STF, Carmem Lúcia. Na ocasião, eles entregaram à ministra um parecer e um memorial com informações históricas, legais e culturais no mundo inteiro relacionados ao sacrifício de animais.
A decisão a ser tomada pelo STF valerá apenas para o Rio Grande do Sul, mas caso seja julgado a favor do MP, “se criaria um contexto de jurisprudência para todos os demais casos envolvendo abate/sacrifício de animais e as mais variadas religiões e tradições presentes em solo brasileiro. Podendo ocasionar o fim destas tradições, ou levar a clandestinidade/marginalidade os/as adeptos/as das mesmas, que continuarão com suas práticas ancestrais”. Alerta Chendler Siqueira, do Fórum Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional dos Povos Tradicionais de Matriz Africana.
Confira o vídeo com Kota Mulanji Mona kelembeketa, coordenadora nacional do Fórum Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional dos Povos Tradicionais de Matriz Africana:
Conheça a lei:
Código
estadual de proteção aos animais (Lei Estadual 11.915/2003)
Art. 2º
- É vedado: I - ofender ou agredir fisicamente os animais,
sujeitando-os a qualquer tipo de experiência capaz de causar
sofrimento ou dano, bem como as que criem condições inaceitáveis
de existência; II - manter animais em local completamente desprovido
de asseio ou que lhes impeçam a movimentação, o descanso ou os
privem de ar e luminosidade; III - obrigar animais a trabalhos
exorbitantes ou que ultrapassem sua força; IV - não dar morte
rápida e indolor a todo animal cujo extermínio seja necessário
para consumo; V - exercer a venda ambulante de animais para menores
desacompanhados por responsável legal; VI - enclausurar animais com
outros que os molestem ou aterrorizem; VII - sacrificar animais com
venenos ou outros métodos não preconizados pela Organização
Mundial da Saúde - OMS -, nos programas de profilaxia da raiva.
Parágrafo
único - Não se enquadra nessa vedação o livre exercício dos
cultos e liturgias de matriz africana
Constituição Federal
Art. 5º:
(...)
VI - é
inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo
assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na
forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;
Art.
225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado,
bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,
impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo
e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
§ 1º
Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:
(...)
VII -
proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas
que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção
de espécies ou submetam os animais a crueldade
Lei dos Crimes Ambientais (Lei 9.605/1998)
Art. 32.
Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais
silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos:
Pena -
detenção, de três meses a um ano, e multa.
§ 1º
Incorre nas mesmas penas quem realiza experiência dolorosa ou cruel
em animal vivo, ainda que para fins didáticos ou científicos,
quando existirem recursos alternativos.
§ 2º A
pena é aumentada de um sexto a um terço, se ocorre morte do animal.
Fontes:
Chendler Siqueira. Subsídios para o debate: julgamento no STF sobre abate tradicional realizado pelos povos de Matriz Africana.
Kota
Mulanji Mona Kelembeketa. TRADIÇÃO ALIMENTA NÃO VIOLENTA.
Disponível em: www.fonsanpotma.com.br
Portal do STJ: http://www.stf.jus.br
Portal do STJ: http://www.stf.jus.br